Friday, January 23, 2009

"... Uma vez realizada (compreendida) a verdadeira natureza do real, que é ser vazia e manifestar-se, apesar disso, sob a forma do mundo dos fenómenos, o espírito liberta-se do domínio da ilusão. Quando fordes capaz de deixar que os vossos pensamentos de dissolvam por si mesmos à medida que vão surgindo, eles atravessarão o vosso espírito da mesma forma que uma ave percorre o espaço do céu: sem deixar rasto...... Os neurobiologistas dir-te-ão efectivamente que o mundo é percebido diferentemente pelas diversas espécies animais. Por exemplo, os seus olhos são sensíveis a luzes de cor diferente ou a radiações invisíveis para os humanos. Assim, um cão pode ver no escuro, porque os seus olhos são mais sensíveis aos raios infravermelhos que os dos humanos. Um pombo pode captar raios ultravioletas que nós não captamos. Os morcegos não se orientam através da vista, mas pela escuta do eco dos ultra-sons que emitem. A sua representação do mundo é, portanto, muito diferente da nossa. S biólogos pensam que estas diferenças resultam da selecção natural: cada espécie desenvolveu os modos de percepção mais adaptados ao seu meio e mais úteis para a sua sobrevivência, para a sua reprodução e para a sua proliferação...... É exactamente o que o budismo chama a «verdade relativa admitida por consenso». O mundo não está certamente entregue ao acaso nem ao arbítrio...... Regressamos à noção de verdade relativa e de verdade absoluta. A relativa corresponde á maneira como os fenómenos nos aparecem, com características identificáveis, a absoluta corresponde à ausência de existência própria destas características, o que implica que a natureza última dos fenómenos, a vacuidade (ou interdependência, apesar de , mais à freente, budista dizer, extranhamente, que há independência entre consciência e matéria) está para além de qualquer explicação e de qualquer conceito...... A realidade é sempre determinada pela interacção do observador e do observado. A complementaridade entre o todo e as partes faz com que seja ora o aspecto «parte», ora o aspecto «global» a revelar-se. O observador nada mais faz do que isolar um certo espectro de aspectos que não têm outra realidade senão a de uma interacção particular entre a observação e a globalidade, isto é, entre uma consciência e o conjunto de que ela faz parte... Para um espírito comum, há uma diferença entre a forma comos as coisas aparecem e a sua verdadeira natureza, o que se traduz, do ponto de vista da nossa experiência pessoal, numa mistura de sofrimento e de bem estar. No termo do caminho do conhecimento capta-se directamente a natureza última dos fenómenos, o que conduz à sabedori imutável na qual todo o contraste entre aparência e realidade desapareceu. Desta sabedoria deriva naturalmente uma compaixão ilimitada ( será a compaixão ilimitada a melhor? Não induzirá em erro? ) pelos seres que a ignorância mantém mergulhados em sofrimento sem fim..."

Extractos das Págs.: 139, 140, 148 e 149 de: O Infinito na Palma da Mão

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